
No discurso «Dos Sublimes», Nietzsche faz Zaratustra dizer que há homens que estiveram sentados à sombra durante tanto tempo, que as suas faces empalideceram.
De facto, há homens que, sem darem por isso, inflaram tanto que já só vivem à sombra de si próprios. Tudo o que dizem é tudo o que há para dizer; tudo o que sabem é tudo o que se pode saber. Eles são a medida da luz que é permitida àqueles que preguiçosamente se sentam à sua sombra e que meneiam a cabeça obedientemente. Coitados, vivem deslumbrados com tantos tons…mas de cinzento. Para esses, acabou a procura porque não há caminho fora da sombra dos homens inflados; para além da sua sombra só há o abismo.
Eles dão o tom – a todas as outras harmonias chamam dissonâncias, e dizem que ferem os ouvidos.
E ai dos outros homens que ousarem ter luz própria ou sair da sombra dos homens inflados. «Que uma luz maldita faça cegar todos os que deixaram a minha sombra», cismam com olhos semi-cerrados e sussurram entre dentes.
Homens inflados, criadores de sombras, formam comunidades de homens macilentos, pálidos e cadavéricos; homens fracos, de pensamento vazio (será que pensam…?), submissos, ensombrados por uma sombra imponente, grandiosa, que os esmaga.
«Haja luz», mas desde que não invada, disperse e dissipe as sombras dos homens inflados, porque, como dizia o ditador, «a muita luz cega o povo». É proibido buracos na sombra, não vá entrar a luz e saírem os homens macilentos.
E há sempre quem se habitue à sombra; há sempre quem tenha medo da noite que antecede o dia; há sempre quem não queira ver o sol…
Luís Melancia
Docente na Lic. de C. Religiões