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Terça-feira, 7 de Outubro de 2008
A mãe de todas as bênçãos…

 

Pediram-me para participar numa cerimónia de casamento.Não sei quem estava mais nervoso, se eu se os meus amigos, os noivos! Eles, porque ião casar! Eu, porque senti nos olhares da assistência o questionar da escolha do orador! Não os censurei! Pensei exactamente o mesmo que muitos cogitaram naquele exacto momento: sou jovem, logo o meu conhecimento e experiência conjugal serão certamente reduzidos. Posta de lado a possibilidade de elaborar uma reflexão “madura” sobre o assunto, todavia, num momento onde o casamento voltou à ribalta das discussões políticas apraz-me, com humildade e honestidade, partilhar também nestas linhas aquilo que me vai na alma sobre este tema.
 
Na minha infantil jornada conjugal, poderei dizer-vos: que o casamento não é bom. É muito bom. Quão agradável é voltar para casa depois do trabalho. Não tanto pela satisfação do espaço que me acolhe mas pelo abraço aconchegante da minha mulher. Da alegria em poder vê-la. Da tranquilidade que experimentado ao ouvir a sua voz. Do estremecimento do meu corpo mediante os seus beijos roubados.
 
Porque o tempo de casado não me permite muita autoridade para vos dizer o que é um casamento, será mais fácil iniciar a minha reflexão pelo que ele não é. Deste modo, ouso começar por identificar três aspectos que o casamento não é, mas em virtude da cultura de consumo, se tem tornado:
 
  1. Não é uma produção cinematográfica. Após a escolha do melhor cenário – leia-se a igreja mais bonita – os noivos cumprem o guião que copiam das revistas. Apresentam-se como actores principais e convidam o melhor elenco para abrilhantar o seu filme.
  2. Não é um desfile de moda. Uma passerelle onde, de forma esmerada, os noivos convidam os convidados a exibir o melhor do seu guarda-roupa. Ligadas as luzes, as máquinas fotográficas e câmaras de vídeo atropelam-se para que tudo e todos fique registado no famoso álbum como se de uma revista cor-de-rosa se tratasse.
  3. Não é uma boda. Uma festa rija recheada dos mais diversos vinhos e requintadas iguarias que, para além de extorquir o dinheiro aos pais dos noivos, rouba a saúde que resta aos convidados. Para não falar do crime de fazer sobrar o dobro daquilo que é necessário.
 
Posso não saber muito sobre o matrimónio mas sei que depois do casamento civil efectuado, a cerimónia religiosa ainda tem importância – não se sabe ainda por quanto tempo – para aqueles acreditam em Deus. Cheios de fé, os noivos convocam a assembleia dos crentes para que, todos juntos – sempre são mais a pedir – possam interceder pedindo aos céus para que a bênção divina se revele numa paixão eterna.
 
Todavia, é sobre este momento que gostava de lançar um desafio reflexivo: Antes de pedirem a Deus a bênção, os candidatos à mesma deviam de ler e meditar no que consiste tal bênção e as condições da sua aquisição! Porquê?
Todos nós estamos habituados a assinar contratos com seguradoras a fim de proteger bens ou prevenir problemas de saúde no futuro. Porém, quantos lêem – com mais ou menos rigor – todas as cláusulas do respectivo acordo? Porque alguns têm feito isso com o casamento religioso, queixando-se à posteriori das garantias anexas ao divino contrato nupcial, para evitar surpresas desagradáveis proponho uma reflexão sobre as três cláusulas que a Bíblia propõe para um casamento abençoado por Deus.
 
 
 
1.      No livro de Génesis (2,18-23) constatamos que Deus, vendo o homem triste, considerou que não era bom para ele permanecer só. Então criou a mulher para que, nessa relação de companheirismo, ambos – e não apenas o homem ou a mulher – experimentassem a alegria em desfrutar da presença um do outro. Dissipada a solidão, a tristeza deu lugar a uma alegria singular. Assim, de individuo abençoado por Deus, Adão e Eva, passaram a constituir uma família cuja presença do conjugue produzia satisfação. Uma família abençoada por Deus é uma família onde marido e mulher são uma bênção mútua. Mais do que pedir a bênção a Deus, a Bíblia propõe aos candidatos a marido e mulher que sejam uma bênção um para o outro sabendo gozar da alegria promovida com presença do conjugue.
 
2.      Tradicionalmente também se lê nestas cerimónias o v.24 do mesmo texto. Os ministros lembram então que a simbologia em deixar a casa paterna deve significar o empenhamento na construção de uma nova família – a sua, não a extensão da dos pais. Uma construção personificada por uma união mística que os considera um só ser. Por isso, aproveita-se para dizer aos pais que não se metam na casa dos filhos, e aos filhos para não viverem na dependência (financeira, emocional, psicológica ou social) dos pais. Está correcto! Porém proponho aos noivos que, se desejam ser uma família abençoada, ao lerem este trecho lembrem-se que a narrativa não apela a deixarmos de ser uma bênção para os nossos pais. No livro de Êxodo (20,12) honrar pai e mãe é o 1º mandamento com promessa para uma vida abençoada e não cessa com casamento. Com efeito, devemos honrá-los continuamente. É correcto apelar a Deus para que nos faça um com nosso conjugue. Porém, o pedido dessa misteriosa união tem como consequência prestar honra ao pai e mãe do nosso conjugue. È muito fácil cair na tentação de procurar uma igreja onde celebrar o nosso casamento a fim de invocar as bênçãos divinas. Porém, a Bíblia adverte que esse mesmo pedido depende do empenho e coragem em ser uma bênção para os nossos pais, em particular com os sogros! Uma família abençoada por Deus é uma família que honra os seus pais e sogros.
 
3.      Quando na narrativa bíblica lemos a chamada do patriarca Abraão (Gn 12,2-3) verificamos que, ao retirá-lo do conforto da sua família ascendente, Deus faz-lhe uma promessa: “Eu te abençoarei… Sê tu uma bênção! … para todas as famílias da terra” Uma família abençoada é uma família que aceita como missão ser também uma bênção para outras famílias. No livro de Actos verificamos que as primeiras comunidade cristãs nasceram de e em famílias que ousaram ser uma bênção. Famílias que abriram as portas das suas casas para hospedar estrangeiros e, mediante o simples gesto de acolher e ajudar, superavam ou minimizavam carências materiais ou espirituais. Quantas vezes estas famílias sacrificaram a sua própria privacidade para serem uma bênção? Aqueles que desejam a bênção divina devem desejar do mesmo modo ser uma bênção para aqueles que Deus colocar no seu caminho.
 
A narrativa bíblica revela que essa bênção se materializa na medida em que a família for, também, uma fonte de bênção para aqueles que vivem à sua volta. Com efeito, a todos quanto estejam a pensar se candidatar ao pedido da bênção divina para as suas futuras famílias, para além da beleza da igreja, da riqueza do programa litúrgico ou popularidade do ministro celebrante, a Bíblia propõe que os mesmos não deixem de contemplar:
 
a)      o desejo de serem sempre uma bênção para o cônjuge, e não apenas enquanto jovens ou por tempo determinado.
b)      o desejo de serem uma bênção para os respectivos pais e sogros.
c)      o desejo de serem uma bênção para as famílias que os rodeiam.
 
Quanto aos que já figuram no Clube dos Poetas Casados, a partir desse dia e no porvir, sejamos também uma bênção para os noivos. Não tanto no valor das tradicionais prendas mas abençoando-os com o nosso amor, como o nosso tempo, com a nossa casa, como o que somos e temos para lhes disponibilizar. Abençoando-os, sendo também um exemplo: uma família onde podem encontrar consolo nos tempos difíceis.
 
Fazendo isto, as Sagradas Escrituras afirmam que Deus, ricamente abençoará a todos. (cf Gn 12,3) Primordial e fundamento de todos os favores divinos, a família é a mãe de todas as bênçãos.

 

 

Simão Daniel

(aluno do Mestrado em Ciência das Religiões na ULHT)

publicado por Re-ligare às 12:39
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1 comentário:
De Florbela Nunes a 31 de Outubro de 2008 às 23:25
Muito bom dia Simão

Para quem ainda é novo, como diz, nas “andanças” do matrimónio, já enriquece muitos com as suas reflexões.
Bem haja!

Florbela Nunes

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